Carta aberta sobre o FECHAMENTO do NEPS
O
NEPS (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre as Sexualidades – CNPJ
04.126.402/0001-98), localizado à Rua Orozimbo Leão de Carvalho, 383,
Assis/SP, vem a público oficializar o encerramento de suas atividades.
Infelizmente, os atuais membros não podem mais assumir as
responsabilidades de mobilização social e não há mais pessoas
interessadas para quem possamos transferir as obrigações do
voluntariado.
Nesse sentido, só nos resta lamentar pelo
ocorrido. Porém, não é só de tristeza que fechamos esse ciclo, mas
também de reconhecimento e alegria pelo tempo vivido. Foram 12 anos de
muitas atividades, intensas e produtivas parcerias com Secretarias
Municipais de Saúde, de Educação, do Trabalho, da Justiça, Universidades
e outras ONGs (Organizações Não Governamentais). Temos orgulho dessa
história construída com perseverança, comprometimento e dedicação.
Aprendemos muito com o voluntariado, com a solidariedade premente em
nossas mentes e corações.
A luta pelos Direitos Humanos de
todas as pessoas dissidentes das normativas sociais é um trabalho
intenso e vagaroso. Nossa luta contra o poder do sistema que nos inflige
modos homogêneos de ser e estar no mundo é retaliante e exaustiva.
Porém, saber que produzimos momentos e experiências nas quais muitas
pessoas aprenderam a se valorizar, a buscar para si mesmas oportunidades
e realizar escolhas que as inserissem socialmente, evitando sua
exclusão e vitimização, compensou toda a dor e agravos que enfrentamos.
Compreendemos que atualmente a mobilização social das pessoas que vivem
à margem dos arbitrários padrões sociais de sexualidade, de gênero, de
beleza, de corporalidade, de saúde, de educação, dentre outros, não
parece mais ocorrer a partir da reunião entre iguais para a afirmação de
suas diferenças.
Em 12 anos, o NEPS não foi a única ONG que
encerrou suas atividades. Muitas outras seguiram o mesmo caminho. Desde
que a AIDS passou a ser uma doença “controlada” (o que nos alegra
muito), findou-se também o estímulo político-sócio-cultural de
mobilização para os cuidados de si. De algum modo, o movimento social
caminhou para grandes “congregações” visíveis nas inúmeras Conferências
Nacionais ocorridas em Brasília, o que acabou por transformar o
agrupamento das minorias em espetáculos corporativos. O movimento social
organizado acreditou que realizando propostas de políticas públicas
dirigidas aos segmentos específicos que defendiam, consegueriam (sem
saber como), que estas propostas fossem um dia concretizadas em Projetos
de Lei, Medidas Provisórias, enfim, realidades. Nada disso ocorreu. Ao
contrário, no Brasil, no que diz respeito às ONGs de defesa de pessoas
vivendo com HIV-Aids, de pessoas LGBT, de mulheres, para citar algumas,
ocorreu uma verdadeira desmobilização, um dispersamento, um
enfraquecimento. O saldo social foi negativo, na medida em que, não foi
possível reverter o paradigma de construção da cidadania. As pessoas
entenderam que "cuidar de si” é o mesmo que ser egoista, não pensar no
outro. A solidariedade sucumbiu ao narcisismo da pós-modernidade que
valoriza o EU como substrato essencialista e natural da condição social,
da cultura, da economia. O EU é, hoje, uma mercadoria, um bem de
consumo, um produto rentável.
Diante disso, não nos resta outra
saída senão fecharmos nossas portas e agradecermos a todas e todos que
junto a nós acreditaram que seria possível transformarmos nossos “Eus”
em “Nós”, que seria possível construirmos uma vida coletiva, de trocas,
de garantia de direitos sociais igualitários. Sinceramente, acreditamos
que em alguns muitos momentos conseguimos fazer isso e levaremos conosco
a lembrança destes dias, pois só estas experiências alegres poderão nos
dar força para continuar.
A vocês, nosso muito obrigado.
NEPS - Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre as Sexualidades.
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